Meses antes do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso decidir nesta terça-feira (26) que transexuais presas devem ir para presídios femininos, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul garantiu a transferência de uma adolescente trans à Unei Feminina Estrela do Amanhã. Antes, ela estava isolada, devido a ameaças e violências, em uma ala da Unei Masculina Dom Bosco.
A decisão em Mato Grosso do Sul foi dada pela 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado no dia 31 de janeiro, após agravo impetrado pelo defensor público da Infância e Juventude de Campo Grande Rodrigo Zoccal Rosa e acompanhado pelo defensor público de 2ª instância Iran Pereira da Costa Neves.
“Nem minha voz é igual a deles” e “Eles não gostam de gente como eu” são frases da adolescente que se encontram nos autos do processo. Segundo relatório social realizado há relatos de que ela teria se cortado com uma “gilete” nos primeiros dias de internação.
De acordo com Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, o artigo terceiro assegura que “às travestis e aos gays privados de liberdade em unidades prisionais masculinas, considerando a sua segurança e especial vulnerabilidade, deverão ser oferecidos espaços de vivência específicos” e que “os espaços para essa população não devem se destinar à aplicação de medida disciplinar ou de qualquer método coercitivo”. Manter a jovem na unidade masculina, conforme o defensor público Rodrigo Zoccal Rosa, seria ir contra a normativa.
“A personalidade de pessoas trans fica impedida de ser desenvolvida com segurança quando elas encontram-se presas em local para pessoas do gênero diverso do que elas se reconhecem, pois o preconceito e ódio são repelidos com violência física, psicológica ou moral”, explicou no agravo.
No acordão, o relator Des. Luiz Claudio Bonassini da Silva reconheceu que “negar à adolescente o direito personalíssimo à sua identidade de gênero e ao consequente convívio social com reeducandas com as quais ela se reconhece, seria negar vigência do fundamento da dignidade da pessoa humana presente na Constituição Federal, bem como ao contido no art. 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente, que impõe que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Nesta sexta, a jovem teve sua medida alterada para a liberdade assistida. De acordo com o defensor público Rodrigo Zoccal Rosa, o cumprimento da medida na Unei feminina “foi tranquilo, sem intercorrências”.
Liminar do STF
A decisão do ministro Luís Roberto Barroso é em caráter liminar e foi tomada em uma ação protocolada pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT).
Segundo Barroso, "trata-se da única medida apta a possibilitar que recebam tratamento social compatível com a sua identidade de gênero". Para o ministro, a providência é necessária, ainda, para assegurar a integridade física e psíquica de transexuais, "diante do histórico de abusos perpetrados contra essas pessoas em situação de encarceramento".
(Texto: Lucas Pellicioni)