Coordenador do Nuspen, defensor público Cahuê Urdiales. (Foto: Danielle Valentim)
Texto: Danielle Valentim
A Lei de Execução Penal (LEP/1984, art. 3º) é clara em estabelecer garantias à pessoa privada de liberdade: o direito à alimentação, ao trabalho, à saúde, à assistência (material, jurídica, educacional, social e religiosa) e à previdência social. É com base na missão institucional e em legislações como esta, que a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por meio do Núcleo do Sistema Penitenciário (Nuspen), atua frente aos desafios da execução penal para amenizar as lacunas na garantia constitucional de pessoas presas no Estado.
Por constatar diariamente que muitas das garantias constitucionais não são plenamente garantidas ao público-alvo, este é o quinto material de uma série de reportagens para promover educação em direitos nos mais variados temas.
O coordenador do Nuspen, defensor público Cahuê Urdiales, pondera que as penas podem limitar a liberdade e impor algumas restrições, mas ressaltam que elas não podem suspender direitos já garantidos como se mostra a cruel realidade atrás dos muros.
“Como defensor público tenho a honra de atuar na defesa dos direitos das pessoas mais vulneráveis, isto é, as pessoas que cumprem pena em nosso país. Lembrando que o STF considerou a situação prisional no país como um ‘estado de coisas inconstitucional’ e ao longo destes mais de 19 anos de carreira, tenho testemunhado as dificuldades e barreiras enfrentadas por esse público e das egressas, sobreviventes do cárcere, que lutam muitas vezes para serem aceitas e reconstruírem suas vidas. Gostaria de destacar, também, a atuação da Defensoria Pública como custos vulnerabilis, ou seja, guardiã dos vulneráveis, que vai muito além da tutela individual e da representação processual ordinária, para abranger a defesa de grupos sociais vulneráveis”, destacou o coordenador.
O defensor também faz referência às Regras de Mandela, um conjunto de princípios que visa garantir os direitos fundamentais e a dignidade das pessoas privadas de liberdade.
“A Regras de Mandela nos norteiam, mas especialmente ao Estado, a tratar todas as pessoas privadas de liberdade e egressas com dignidade e respeito. Ninguém deve ser estigmatizado ou discriminado por estar ou ter passado pelo sistema prisional. Afinal, a pena cumprida não pode ser um eterno castigo, mas sim um momento de reflexão, aprendizado e transformação para os que assim o desejarem. Ao promover a conscientização sobre os direitos das pessoas privadas de liberdade, estamos não apenas cumprindo nosso papel como defensores públicos, mas também contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva”, pontua o coordenador.
A Defensoria cuida para que a execução da pena aconteça de maneira justa e nas formas da lei, e busca garantir os benefícios legais aos assistidos. Realiza visitas nos estabelecimentos prisionais e pede providências para seu adequado funcionamento.
Tem direito de ser assistido pela defensoria, assistidas e assistidos que recebem até 3,5 salários mínimos, ou seja, R$ 4,9 mil.
Direitos específicos
Conforme cartilha da série “Fazendo Justiça” da Secretaria Nacional de Políticas Penais, PNUD Brasil e Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a privação de liberdade pode acontecer em caráter provisório ou por condenação. Existem tipos diferentes de prisão (flagrante, preventiva, temporária, domiciliar) e regimes de cumprimento de pena de reclusão (aberto, semiaberto e fechado), além da medida de segurança (medida específica imposta a pacientes em sofrimento mental). Cada regime tem suas regras.
Para além dos direitos fundamentais, existem direitos específicos de todos que estão em situação de cumprimento de processo e execução penal e, neste momento, a maior parte da população carcerária se encontra em hipervulnerabilidade econômica e, consequentemente, necessita dos serviços da Defensoria.
Situação de cela em meio a crise sanitária de sarna na PED.
Os principais direitos
· A Lei de Execução Penal diz que é dever do Estado a garantia da assistência jurídica, dentro e fora dos estabelecimentos prisionais, às pessoas que não têm condições de pagar por advogado(a).
· A individualização da pena - é um princípio constitucional e é feito diligentemente pela Defensoria de MS, com o projeto Porta de Entrada que checa toda a situação da pessoa presa que está chegando.
· Assistência material - consiste no fornecimento de alimentação, instalações higiênicas e vestuário. Este, deve estar de acordo com o clima.
· Alimentação, que está nas Regras de Mandela. Além de nutritivas, devem ser servidas regularmente.
· Direito de comunicação externa, por meio de visitas presenciais e virtuais, e a correspondência por cartas
· Direito a saída temporária;
· Direito ao Livramento Condicional - é um benefício penal que dá direito ao cumprimento do restante da pena em liberdade;
· Direito ao chamamento nominal (ser chamado(a) pelo nome) - é um dos direitos previstos na Lei de Execução Penal. Esta garantia é muito desrespeitada quando se trata de indígenas e pessoas trans.
· Direito a progressão de regime - significa a transferência da pessoa que cumpre a pena privativa de liberdade para um regime menos rigoroso
· Direito a revisão criminal, que é uma nova análise da decisão da condenação;
· Remição de pena pelo trabalho e práticas sociais educativas - abatimento de parte do tempo de pena pela participação em atividades sociais educativas ou de trabalho, incluindo também a leitura.
· Transferência - a possibilidade de mudança, da pessoa privada de liberdade, para outra unidade prisional. O pedido pode ser feito pela Defensoria Pública;
· A representação - o direito de toda pessoa a fazer pedido, a qualquer autoridade, em defesa de seus direitos ou contra ilegalidades e abuso de poder.
· Indulto, o perdão da pena (extinção de punibilidade); e comutação, o perdão de parte da pena (indulto parcial)
· Respeito às condições físicas, intelectuais e psíquicas, principalmente no caso de idosos.
Se você precisa de atendimento ou conhece alguém que precisa a unidade do Nuspen fica na Rua Barão de Melgaço, 128, Centro. O agendamento de atendimento também pode ser feito via plataforma AQUI.
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