Texto: Danielle Valentim
A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul participou, nesta terça-feira (13), do seminário “o impacto do racismo estrutural na saúde da mulher negra e quilombola”, na Câmara Municipal. O encontro foi feito em parceria com a vereadora Luiza Ribeiro, a deputada estadual Gleice Jane (PT), a deputada federal Camila Jara (PT) e a Coletiva Sempre Vivas.
A instituição foi representada pela coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem), a defensora pública de Segunda Instância, Zeliana Sabala, que iniciou sua participação destacando seu lugar de fala como uma aliada, considerando, sua cor de pele, orientação sexual, posição na sociedade enquanto defensora pública e diante das diversas realidades apresentadas durante o evento.
“O que vivenciamos dentro da Defensoria Pública é a replicação de tudo dito durante o seminário. No Núcleo, nós desenvolvemos ações de conscientização e educação de direitos a todas as pessoas, mas especialmente às mulheres e meninas, pois sabemos que ser mulher por si só já constitui um sério fator de risco e quando colocamos as lentes de raça sobre essa parcela da população podemos identificar aspectos da sociedade que resultam em desigualdades sistêmicas que causam impactos diretos na saúde mental desse grupo”, iniciou a coordenadora.
Escassez de especialistas - Durante a explanação, a coordenadora reiterou a importância de se dar atenção a políticas efetivas, que possibilitem suporte para sobrevivência do povo preto e pardo, considerando que o racismo enquanto fenômeno histórico, desumaniza pessoas negras colocando-as em uma situação de vulnerabilidade contínua.
“Ainda que precisando melhorar a cada dia, a Defensoria procura atuar na garantia de direitos às mulheres vítimas de violência de gênero que aportam para o atendimento e essas mulheres são em sua grande maioria mulheres negras. É fato, são elas que representam o maior número de vítimas de violência doméstica, de violência obstétrica, e também quando o assunto é a busca da rede relacionada aos direitos sexuais e reprodutivos. É sempre a mulher negra na base das maiores violações de direito, pontua.
A defensora destacou que a discriminação racial constante - experiência de preconceito e exclusão social -, evidentemente têm efeitos negativos na saúde levando a mulher ao desenvolvimento de distúrbios mentais como ansiedade e depressão, cujo tratamento, ainda é mais dificultoso porque impera a falta de profissionais de saúde mental especializados em questões raciais.
“Há escassez de serviços disponíveis que levam em conta essa especificidade e, justamente, em razão do racismo estrutural e institucional há ausência de financiamento adequado para o acesso à assistência da saúde. Inclusive a atenção primária precisa se reconhecer como porta de entrada para essa questão de violência contra a mulher, porque muitas das vezes as queixas de insônia e falta de apetite até podem indicar uma necessidade de medicalização, mas, para além disso, por certo indicam um sintoma de violência, a violência sofrida dentro de casa, a violência institucional e a violência estrutural”, explica.
Racismo estrutural - Enquanto coordenadora do Nudem, a defensora pondera sobre a necessidade da saúde pública vestir as lentes de gênero para realizar atendimento com qualidade, com escuta integral do relato da mulher para assumir papel de protagonista no combate a violência contra a mulher.
“Para além da saúde mental, que é expropriada pelo racismo presente nas atitudes e tomadas de decisão das pessoas brancas, também é possível identificar o efeito do racismo estrutural na vida das pessoas negras quando o assunto é política de drogas, que ao invés de encarar o consumo de substâncias psicoativas como problema de saúde, o consideram como problema criminal e acaba promovendo encarceramento em massa, sendo que 62% das mulheres que estão em situação de cárcere, a maioria são mulheres negras e respondem a crimes sem violência, como o crime de tráfico de drogas, enquanto essa proporção cai para 26% quando a avaliação recai sobre a população masculina recolhida pelo sistema prisional”, destaca.
Apagamento - Outra questão importante levantada pela coordenadora do Nudem, e contribui para o aumento dos níveis de estresse, ansiedade e marginalização, é o apagamento, a falta de representação e visibilidade da parcela da população que ao fim, ao cabo, representa mais de 50% da população brasileira.
“Para combater o racismo estrutural e institucional é necessário adotar abordagens antirracistas em todos os lugares, promover a igualdade racial e garantir a representatividade adequada com vistas a alcançar o fortalecimento das políticas públicas de saúde mental, a criação de espaços seguro para criação de suporte e o investimento em programas específicos para atender a população negra e quilombola. Para finalizar, cito a frase de Audre Lorde: não sou livre enquanto outra mulher for prisioneira, mesmo que as correntes dela sejam diferentes das minhas", finalizou a coordenadora”, finalizou.
Confira o evento na íntegra AQUI.